Almeida Henriques

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Menos mal

A sofisticação do mundo actual, os instrumentos ao dispor dos governos e instituições internacionais, a integração em blocos regionais, como a União Europeia, criou, entre outros aspectos, a convicção generalizada de que constituíam longínquos os cenários similares à grande depressão que se viveu nos anos trinta do século passado.
Mesmo as mais recentes crises, como nos anos noventa, atravessadas por algumas das economias asiáticas, que passaram num ápice do apogeu à recessão e estagnação, para surpresa dos que continuavam a prever elevadas taxas de crescimento para esses países, não constituiu indício suficiente para abalar a tese mais comummente aceite de que se dispunham nos nossos dias dos mecanismos capazes de debelar com celeridade quaisquer contratempos mais preocupantes na economia global.
Nem sempre, porém, como se constatou, a teoria económica é perfeita.
As profundas transformações à escala mundial, positivas e negativas, que vivemos nas últimas décadas, vieram ensinar-nos que também os conceitos têm de ser adaptados aos novos paradigmas, aos novos mecanismos de mercado, aos novos actores e avanços tecnológicos que certamente não pararão de nos surpreender no futuro próximo.
Recuar meros 50 anos deixa-nos perplexos com a celeridade com que se evoluiu neste meio século. Tentar avançar outros 50, sem futurismo, pode-nos fazer reflectir sobre as proporções dos avanços que se registarão ao nível das tecnologias, da genética, das biotecnologias, do conhecimento.
Vivemos o que alguns autores denominam “a aceleração da história” ou no conceito mais recente “ a “instantaneidade”, relacionada quer com o ritmo veloz dos acontecimentos dos nossos tempos, quer com a sua ocorrência e assistência em tempo real, designadamente pelo advento da internet e das comunicações móveis.
Para o bem e para o mal estamos em rede, oferecem-se oportunidades inúmeras, sociais e económicos, mas também teremos de estar preparados para enfrentar as súbitas vicissitudes da economia e das conjunturas menos favoráveis.
No percorrer desta evolução, crises como a que actualmente atravessamos terão novamente lugar.
Os temas da recessão, estagnação, inflação, deflação, retoma não se darão por findos dentro de algum tempo, quando as economias encontrarem os seus períodos de acalmia e crescimento, como estes ciclos normalmente ditam.
Trata-se, por isso, de um período excelente para debater todas estes interessantes conceitos e teses, revê-los à luz da revisão que também se dará nos diversos níveis de governância, dos poderes públicos, da sociedade, das empresas.
Será fácil, nesse debate, optar por algumas regressões facilitistas, desresponsabilizando-nos e considerando que, na outra crise que um dia há-de vir, o Estado se encarregará de tudo resolver, independentemente dos custos que tal opção acarreta para todos nós.
Difícil constituirá pugnarmos, sem receio e através de propostas concretas, sem temer a globalização das economias, das políticas e do pensamento, por nações e regiões que apostem nas pessoas e nas empresas, garantes da riqueza de um território que se pretenda competitivo a uma escala mundial.
O excessivo peso do Estado fragiliza cidadãos e organizações. A sua dependência da coisa pública, designadamente no contexto em que se processa no caso do nosso país, castra a capacidade de empreender, de inovar, de participar, de formar redes.
Alterar este registo é, seguramente, um dos principais desafios que teremos de enfrentar, o que implica reformas das instituições, dos dogmas, das mentalidades e uma atitude mais firme de cidadania e de participação.
(Re) criar um Estado facilitador, amigável da iniciativa privada, estimulador do risco e dos desafios, que presta contas e gasta bem o nosso dinheiro, será contribuir para um país mais moderno, mais capaz de enfrentar novos mundos e as vagas de mudanças positivas, mas também de novas crises que se proporcionarão.
“Menos mal” é a forma como se vão comentando os vários indicadores nacionais e internacionais que sucessivamente surgem.
Menos mal é a forma como grande parte dos agentes do país reage, havendo mesmo quem se satisfaça e regozije com taxas que envergonhariam uma nação moderna.
Muito mal é a forma como alguns percebem que o menos mal apregoado em nada se deve à retoma interna, mas ao efeito da retoma dos países de que a nossa economia depende.
Francamente mau é o desempenho da nossa economia nos últimos anos, que afastou territórios e empresas da rota de convergência com os países mais desenvolvidos da União Europeia, aumentou o nosso endividamento público e externo e incrementou as desigualdades sociais e desemprego.
A Região Centro de Portugal, ainda que afastada das rotas metropolitanas e do poder, na diversidade que a marca, tem feito, contrariando a tendência nacional, um percurso e um esforço acrescentado para, a par da sustentabilidade dos seus sectores produtivos mais tradicionais, a emergência de um conjunto de clusters com maior base de qualificação, inovação e tecnologia, que podem assumir-se como actividades motoras de um novo modelo de desenvolvimento.
Esse esforço é essencialmente fruto da grande capacidade empreendedora dos seus empresários, da sua vocação exportadora, da existência de Centros de Conhecimento e Tecnologia que estão cada vez mais próximos das nossas PME, da capacidade de estabelecer planos de acção, metas e indicadores, como, sob a égide do CEC/CCIC, fizemos na última Convenção Empresarial, através do Pacto para a Nova Centralidade.
Será a vontade dos nossos empresários que ditará a retoma, a convergência, um futuro competitivo para a Região de que tanto nos orgulhamos.
In Revista Indústria, 9 de Novembro de 2009

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