Almeida Henriques

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Cultura – O papel da educação e formação

Sem generalizar, a maioria dos formatos de entretenimento e informação dos nossos dias, nomeadamente televisão e imprensa, submete-se mais a um registo mediático e de lugares comuns do que à vertente de educação, formação e transmissão de valores.
Tal fenómeno não é, obviamente, exclusivamente nacional, mas, combinado com o elevado gap ao nível das qualificações de que o nosso país padece, que as sucessivas reformas não têm invertido de forma satisfatória, criam condições pouco favoráveis a um ambiente cultural.
A procura da arte, a afluência aos teatros e outros espectáculos, a leitura, sem cuidar aqui da sua tipologia, ficam aquém do que seria desejável no nosso país, especialmente fora dos grandes centros urbanos.
Esta realidade tem obviamente consequências sociais que se não limitam à maior ou menor educação, à literacia ou ileteracia mais ou menos profunda, de um ponto de vista estatístico, contendendo com outras dimensões, incluindo a económica.
Efectivamente, embora possa constituir matéria controversa, muitos analistas estabelecem um paralelo entre as performances das nações e os aspectos culturais. Alude-se aqui, naturalmente, à cultura na acepção das atitudes e valores interiores que guiam uma população, mas, crê-se, esse conceito mais vasto e mobilizador, ou não, depende também das circunstâncias acima expostas.
Como nos ensina David Landes, invocando Max Weber, se aprendemos alguma coisa através da história do desenvolvimento económico é o facto de a cultura ser geradora das suas diferenças, ao indagar a capacidade de iniciativa de alguns povos em contraste com outros, ou mesmo dos expatriados que manifestam a sua atitude empreendedora quando fora do seu meio.
Portugal, a aceitarmos esta teoria, não fugirá à regra, sendo visíveis ao longo dos séculos as diferenças entre as épocas de uma sociedade aberta ao conhecimento, à informação, ao contacto com outras culturas, cosmopolita, e os tempos do isolamento, de restrições no acesso à educação, de mono ideias ou mono ideais.
Hoje o nosso país está enquadrado num grande mercado que é a União Europeia e a sua economia e sociedade estão expostas às múltiplas influências que essa integração implica, num mundo cada vez mais global, mas onde, paradoxalmente, o local, o que nos é próprio, o que marca as nossas identidades assume um especial relevo.
É nesta dicotomia global/local que muitas dinâmicas, incluindo as culturais, farão as suas afirmações, desde que acompanhadas de uma aposta séria na educação e formação, mobilizadores dos demais factores, incluindo o de um verdadeiro e livre mercado cultural.
António Almeida Henriques
Presidente da Assembleia Municipal de Viseu
In Revista Reatro Viriato, 22 de Novembro de 2007

sexta-feira, 2 de março de 2007

DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS

A busca de receita leva a nossa Administração Fiscal a sofisticar cada vez mais os mecanismos de combate à fraude e evasão fiscais nos seus diferentes domínios.

Se a penhora de contas bancárias e de bens das empresas, para além da responsabilidade individual dos gestores e empresários, são hoje uma constante, anuncia-se agora a possibilidade de o Estado obstar os pagamentos às empresas se estas não tiverem a sua situação fiscal regularizada.

Assim, a fazer fé nas notícias, os hospitais públicos, institutos públicos, ministérios, escolas, universidades e politécnicos, autarquias ou a central de compras do Estado não poderão proceder a pagamentos a fornecedores sempre que estes mantenham dívidas tributárias.
Ao mesmo tempo, corre em paralelo um mecanismo que permite recuperar verbas em dívida, dentro dos próprios organismos públicos, através das penhoras automáticas de créditos.

Mais uma certidão que passa a ser obrigatória, ao arrepio do Simplex, embora o fornecedor possa autorizar a entidade pagadora à averiguação, junto do fisco e da segurança social, da sua situação tributária.

Numa conjuntura complicada para as empresas, sobretudo para as Micro e PME, aperta-se cada vez mais o garrote, sem uma atitude igualmente exemplar do Estado.

Com estes procedimentos de rigor, que aplaudo por contribuírem para uma maior justiça fiscal e combate à concorrência desleal, mas sem um comportamento de bom senso por parte dos que andam no terreno a fazer cumprir a lei, poderemos matar a “galinha dos ovos de ouro”.

Efectivamente, que dizer do sistemático incumprimento do Estado?

Os hospitais públicos, as autarquias, a administração central, algumas EPE, não cumprem, por regra, os prazos que definem para os seus pagamentos; nalguns casos estamos a falar de meses ou mesmo de mais de um ano.

Não estaremos perante dois pesos e duas medidas?

Ao mesmo tempo que se legisla no sentido de apertar o cerco aos faltosos, porque não legislar também para proteger as empresas?

O Estado não cumpre os prazos de pagamentos, mas exige o pagamento do IVA, penhora contas bancárias e bens, congela pagamentos, pretende avançar para as compensações de créditos, quando muitas vezes “o incumpridor” ainda não recebeu o dinheiro …

E o particular? E a empresa que sistematicamente é vitima dos incumprimentos do Estado?
É tempo de legislar para proteger a economia dos incumprimentos do Estado, proporcionando, a título de exemplo, às empresas, a possibilidade de utilizar os créditos vencidos que têm sobre o Estado para compensarem dívidas fiscais.

É tempo de tornar obrigatório o pagamento do IVA que resulte de fornecimentos ao Estado, depois do recebimento, pois, no extremo, um empresário ou gestor pode ser acusado do crime de abuso de confiança por apropriação abusiva de verbas em sede de IVA, caso não o pague, apesar de ainda não o ter recebido do próprio Estado.

Era importante que, ao mesmo tempo que se promovem estas medidas moralizadoras, também o Estado as assumisse como suas, legislando no mesmo sentido para os particulares.

Se assim for, não há desculpas para os incumpridores e o braço da lei deve ser forte.
Com a prática actual, estamos mais uma vez perante a prepotência do Estado, a lei do mais forte. Como diz o povo “bem prega o frei Tomas, olha para o que ele diz, não para o que ele faz”.
In Jornal de Negócios, 2 de Março de 2007

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Uma Ausência Esclarecedora

As declarações do Ministro da Economia proferidas no decurso de uma reunião com empresários chineses, é a todos os títulos deslocada e reprovável.

Vai ao arrepio daqueles que procuram mudar a imagem do nosso país e o seu paradigma de desenvolvimento, procurando mudar a agulha do modelo assente na exploração da mão d’obra barata.

Quando ouvi, pensei que se trataria de um “lapsus linguae” e que rapidamente ouviria a retractação e a reafirmação de que queremos um modelo assente numa maior produtividade, na competitividade, na promoção das exportações, numa aposta na criação de valor e de estarmos presentes nas redes de distribuição, em suma num crescimento baseado na inovação.

Para além do lapso não assumido já habitual noutras ocasiões, como a declaração do fim da crise, o que mais me preocupa não são os dislates do Dr. Manuel Pinho, mas sim o facto de a economia e a competitividade serem cada vez menos o aspecto central da política do Governo e o titular da economia não assumir um papel relevante, central e activo no Governo.

Durante estes dois anos, e apesar da enorme expectativa criada, designadamente com a apresentação da ideia do Plano Tecnológico na campanha eleitoral, o Dr. Manuel Pinho não só tem decepcionado como perde todos os dias peso político no Governo.

Foi pai do plano tecnológico mas o Primeiro Ministro chamou a si o dossier nomeando um responsável sob a sua directa responsabilidade, não assumiu um papel central no PNACE e, recentemente, no QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional) é totalmente relegado para segundo plano.

Sendo a Agenda de Lisboa o enfoque do QREN, com 60% das verbas afectas a esta, centrada na melhoria das qualificação e da competitividade, verificamos que o Ministro da Economia não faz parte da troika que o comandará, antes encontramos o Dr. António Costa (Estado e Administração Interna), o Engº. Mário Lino (Obras Públicas) e o Dr. Vieira da Silva (Emprego).

Que ilação tirar? Mais uma vez o Dr. Manuel Pinho é secundarizado, politicamente desautorizado e, estou certo que, se confrontado, desvalorizará estes factos e dirá com o seu ar prazenteiro e simpático que foi por sua própria opção que se subalternizou perante os colegas.

Ninguém acreditará pois, se o QREN tem três áreas temáticas, Competitividade, Qualificações e Valorização do Território, só está fora o Ministro que deveria tratar da competitividade.

E esse é que é o verdadeiro problema. Não é o Dr. Manuel Pinho ser subalternizado, é sim a secundarização a que este Governo condena a competitividade nacional.

Temos razões para estar preocupados, pela economia, pelo papel central que a politica económica do Governo não tem e a desvalorização constante das acções viradas para as micro e PME’s.

O Dr. Manuel Pinho só se preocupa com o investimento, o que não merece a minha crítica, pois é fundamental para o País, só esperando que tudo o que tem sido anunciado seja concretizado, mas a politica económica não se resume a esta vertente.

Se na estrutura do Governo tivéssemos um Ministro do Investimento e outro das PME’s estaria mais descansado, assim, sinto-me cada vez mais preocupado pelo papel que o Senhor Ministro não desempenha de motor, de motivador, de actor central do governo na defesa de politicas que promovam as micro, PME’s, o investimento, a inovação e o crescimento económico.

É que quem perde não é só o Ministro, somos todos nós!

In Jornal de Noticias, 1 de Fevereiro de 2007