Almeida Henriques

terça-feira, 9 de novembro de 2004

Visita à China

Tive o privilégio de, ao longo de uma semana visitar a China, passando por Pequim, Xi-An, Cantão e Hong Kong.
Nada do que havia lido sobre a China se compara àquilo que vi; é óbvio que visitei pouco mais do 10%, do ponto de vista territorial, mas o balanço é arrasador, um misto de deslumbramento, espanto e preocupação; e repare-se que não visitei Xangai, aquela que é considerada a província mais dinâmica.
Numa semana, aterrei em quatro aeroportos novos, três deles inaugurados há pouco mais de 2 anos, ao nível dos melhores que existem na Europa e no mundo, sempre ligados por excelentes auto-estradas às respectivas cidades; pensei que ficaria por aqui, mas não, por exemplo, só em Cantão, no sul, uma das províncias mais pujantes existem mais de 10.000 Kms de auto-estradas.
Começando por Pequim, abstraindo-me da estatura das pessoas e dos olhos oblíquos, julgaria estar numa qualquer grande cidade dos EUA, com avenidas largas, pejadas de viaturas, num parque automóvel moderno, um mar de arranha-céus, com arquitectura arrojada, o comércio pujante, respira-se dinheiro e crescimento, estamos a falar de uma sociedade já com 80 milhões de consumidores com poder de compra ( este número triplicará no espaço de 10 a 15 anos ! ).
Quanto a economia de mercado, está no código genético do Chineses!
Uma história que espelha esta afirmação – uma das pessoas que nos acompanhava, um dos quadros mais destacados da Comissão Politica Consultiva, afirmava que os russos não estão preparados para uma economia de mercado, ao contrário dos chineses; referiu que, em Moscovo, foi comparar sofás e negociou um desconto de 5% com o comerciante; após a negociação, referiu que, em vez de um sofá, iria comprar 5, que desconto obteria; o russo referiu, 1% por cada sofá; espanto do chinês, porquê obter um menor desconto se estou a comprar cinco ? Resposta, se não fosse assim, só o chinês ganharia !... Exemplo divertido, mas ao mesmo tempo demonstrador !
Ao visitar a muralha da China, com os seus imponentes 6.000 Kms, visível do espaço, construída entre séc. VI aC e XIII dC, percebi um pouco da grandeza deste povo, da sua visão, da sua cultura, da sua capacidade !...
A Cidade Proibida, mais um momento exaltante, entramos no meio do filme o Último Imperador !...
Tienamen, o silêncio momentâneo, o pensar que foi aqui que se iniciou o processo de abertura da China ( na última reunião do Partido Comunista Chinês, completou-se o período de transição politica que durou três anos e que consolidou no poder a chamada quarta geração politica - na sequência de Mão Tse Tung, Deng Xiao Ping e Jiang Zemin -, através da nomeação de de Hu Jintao, Presidente da República e Secretário Geral do PC Chinês para a presidência da Comissão Militar Central, tornando-se o grande líder da China ).
Chegado a Xi-An, novos motivos de interesse, no programa, além dos Guerreiros de Terracota ( de cortar a respiração !... ), a visita a um Parque Cientifico e Tecnológico, instalado, pasme-se, numa extensão de 50 Km2, 3.000 empresas instaladas, diferentes centros de investigação e desenvolvimento tecnológico, a mesma sensação de estratégia, dinheiro e crescimento.
Em Cantão, onde pensava já não me surpreender, a província mais pujante de China, a principal porta virada para o exterior, cerca de 80 milhões de pessoas, representa 11.5% da economia do país ( 162, 4 biliões de USD ), a primeira província da China há 18 anos consecutivos, em matéria de exportações, com o produto interno bruto a crescer 13% ao ano, ao longo dos últimos 24 anos, representando 33,3% das exportações do País. O PIB per capita dos residentes do Delta do Rio das Pérolas é de 3.700 USD, num País onde este valor é de cerca de 1.270 USD ( valor previsível para 2004 ); perspectiva captar 13 biliões de dólares anuais de investimento estrangeiro nos próximos 5 anos.
Visitei a feira de Cantão, estava a decorrer numa das suas duas edições anuais, 10.000 expositores ao longo de 13 pavilhões, uma montra de tudo o que se produz na China ( só portugueses, estavam acreditados 500 nesta feira, tive oportunidade de encontrar um compatriota que andava a comparar brindes publicitários para os três grandes e para a FPF ).
Em traços gerais, impulsionada pelas importações, pelo investimento estrangeiro e público e pelo aumento do consumo interno, a economia chinesas tem crescido ao ritmo de 9% ao ano.
Para além da aposta na captação de investimento estrangeiro, promove-se a criação de grupos económicos internos, aposta-se na produção assente no custo da mão de obra, sem descurar a aposta no desenvolvimento tecnológico; verifica-se também uma forte atenção aos circuitos de distribuição, veja-se o desenvolvimento da rede de lojas chinesas em Portugal.
Como objectivo a China perspectiva fazer triplicar o seu PIB per capita nos próximos 20 anos ( de 1.000 para 3.000 USD per capita não é muitos, mas multiplicado por 1.300 milhões !... ), o que catapultará a já sexta economia do mundo para um segundo lugar, empurrando a Europa para terceiro; com este ritmo de crescimento, poderá ser a primeira economia no ano 2050.
Faz pensar, obriga-nos a repensar estratégias, incrementar, no seio da União Europeia a estratégia de Lisboa, promover a fixação de quadros e desenvolver a aposta na inovação, qualidade e qualificação dos recurso.
Por outro lado, há que levar a China, no âmbito da Organização Mundial do Comércio a cumprir as regras, jogar as mesmas regras de jogo, e o mesmo quanto ao cumprimento dos objectivos de Quioto, do ponto de vista do cumprimento das normas ambientais.
Quanto ao mercado nacional, e pensando nas redes de distribuição chinesas, é preciso que cumpram os horários e as normas de higiene e segurança no trabalho, bem como toda a legislação portuguesa, designadamente legislação de trabalho e fiscal, é o que devemos exigir da administração pública portuguesa!
Não se pode travar este crescimento, até porque é importante para o equilíbrio desta zona do globo, não se pode é adormecer e é fundamental que as regras de jogo sejam iguais para todos.
In Jornal de Negócios, 9 de Novembro de 2004