Almeida Henriques

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Intervenção na Sessão da Assembleia Municipal de Viseu Comemorativa dos 35 Anos do Poder Local

À semelhança dos últimos anos a boa tradição cumpre-se, a Assembleia Municipal de Viseu comemora o 25 de Abril, sendo que este ano opta por efectuar uma sessão em que evocamos os 35 anos do Poder Local e o impacto que teve no desenvolvimento de Portugal na era Democrática.
Quero agradecer a presença de todos os Senhores Deputados, dos Senhores Presidentes de Junta, do Senhor Presidente da Câmara Municipal de Viseu e dos Senhores Vereadores, esta sessão homenageia todos aqueles que, ao longo dos últimos 35 anos, dedicaram a sua vida ao desenvolvimento do nosso Concelho, orgulhamo-nos do percurso colectivo que efectuámos, que permite ter hoje Viseu entre os melhores Concelhos para viver, estou certo que todos comungamos deste orgulho de sermos viseenses, independentemente das nossas diferenças ou convicções.
Cumprimento na pessoa do Sr. Presidente da Junta de Freguesia de Vila Chã de Sá, Prof. José Ernesto, toda a população da Freguesia e do Concelho, desde já agradeço a hospitalidade a que já nos habituaram, o local onde nos encontramos dignifica a nossa sessão.
Uma palavra de apreço para todos os que se dignaram a aceder ao nosso convite, os nossos convidados e os habitantes da Freguesia que se associam a esta comemoração.
Um agradecimento por antecipação ao Dr. Fernando Carvalho Ruas, um cidadão exemplar, um autarca de mão cheia, Viseu deve-lhe muito, os nossos concidadãos têm correspondido sempre a toda a dedicação e amor que tem colocado no desenvolvimento de Viseu.
Não poderíamos fazer melhor escolha para a conferência que se segue, quem melhor do que o Dr. Fernando Ruas poderia falar sobre 35 anos do Poder local?
Afinal de contas falará de experiência vivida, quer como Presidente da Câmara de Viseu, quer como Presidente da Associação Nacional de Municipios Portugueses.
Senhoras e Senhores
Há uma afirmação que farei que julgo merecer a unanimidade dos presentes, o Poder Local foi a maior conquista do 25 de Abril, logo a seguir à da Liberdade; direi mesmo que democratizou o investimento público, aproximando-o dos seus destinatários, os habitantes dos vários Concelhos.
Se o nosso País é hoje excessivamente assimétrico, estou certo que ainda mais seria se não fosse a intervenção do Poder Local ao longo destes 35 anos.
A 25 de Abril de 1974, o município era uma instituição administrativa e politicamente diminuída e desacreditada, resultado do modelo centralizador que presidiu à organização administrativa do Estado Novo.
Em 1974, o município encontrava-se malvisto aos olhos dos políticos e a implantação do regime democrático impôs rupturas fomentando a descentralização e a autonomia municipal.
A promulgação da Constituição Portuguesa de 1976 consagra a organização democrática das autarquias locais, definindo os princípios do seu estatuto jurídico e da sua autonomia financeira e administrativa reconhecida no artigo 237° da Lei Fundamental.
A reforma do regime financeiro das autarquias locais consagrou constitucionalmente dois objectivos:
- a «Justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias», e
- a «correcção das desigualdades entre autarquias do mesmo grau».
Em toda a evolução da Administração local há ciclicamente movimentos que vão do poder central para a periferia e desta para o poder central.
No Estado Novo, houve claramente a predominância do poder central sobre a periferia e, por isso, as diversas divisões a que o país foi sendo sujeito passaram sempre por uma imposição a partir de Lisboa.
Além disso, foi, normalmente, o poder central que governou as autarquias locais e ainda foi este que assumiu as novas e crescentes funções do Estado, enviando os seus agentes especializados para as executarem.
Pode mesmo dizer-se que até quando houve alguma descentralização, foi porque o Poder Central assim o decidiu.
No entanto, e apesar de todos os esforços empreendidos no sentido de melhorar a vida do poder local, o que se pode observar é que a carência de recursos próprios e consequente necessidade de financiamentos centrais têm-se mantido até aos nossos dias.
Os municípios portugueses no Estado Novo viveram a tensão entre o poder central e os Concelhos, hoje, experimentam a tensão entre um leque alargado de competências e um espartilho financeiro, um conjunto de competências que foi delegada sem o respectivo pacote financeiro, para além de outras que deviam ser delegadas por serem melhor desempenhadas na proximidade.
De facto, numa lógica de eficácia e proximidade às Pessoas, cumprida a primeira fase das infra-estruturas, o poder central teima em não largar mão de competências que deveriam ser atribuídas aos municípios com o respectivo financiamento.
Face ao momento que atravessamos, penso que esta é mesmo a reflexão central que devemos fazer, quem faz melhor, gastando menos, numa lógica de proximidade às populações.
Comparando, por exemplo, a actuação do Parque Escolar e do nosso município verifica-se que, enquanto a remodelação das Escolas Alves Martins e Emidio Navarro custaram 30 milhões de euros, os dois novos Centros Escolares de Rio de Loba e Viseu Norte, irão custar 4 milhões.
Mesmo salvaguardando as diferenças entre estas obras, convenhamos que se a remodelação destas Escolas tivesse sido entregue à nossa autarquia, ficaria muito mais barata, aqui está um exemplo de como poderia funcionar a articulação entre administração central e local
Este é só um exemplo, mas outros existem como a área social, o alargamento ao nível da educação, da saúde, entre outros.
Não obstante os avanços experimentados com o 25 de Abril de 1974, a principal preocupação dos municípios até há bem pouco tempo concentrou-se na construção de infra-estruturas e a satisfação das necessidades básicas das populações, são eles os responsáveis pela resolução dos problemas do abastecimento de água ao domicílio e o saneamento básico, numa primeira fase, e logo após nas inúmeras infra-estrturas como Escolas, Bibliotecas, Pavilhões Gimnodesportivos, Piscinas, etc. etc.
As autarquias alcançaram uma dinâmica própria e deram um salto qualitativo, precisam agora de passar a outra fase.
A emergência em que se encontra o País poderá ser aproveitada para encontrar um novo equilíbrio, estou certo que a ANMP tem boas ideias, espero que um novo Governo esteja mais disponível para as ouvir.
A Carta Europeia de Autonomia Local consagra o conceito de autonomia local como o «direito das autarquias locais regulamentarem e gerirem, nos termos da lei, sob sua responsabilidade e no interesse das respectivas populações, uma parte importante dos assuntos públicos». (Carta Europeia de Autonomia Local, artigo 3°, n.º 1.)
As autarquias locais dispõem de completa liberdade de iniciativa, relativamente a questões da sua competência que é fixada por lei.
O processo de atribuição de responsabilidades às autarquias locais não emerge nesta carta de forma taxativa, apenas as aconselha quando enumera que o seu exercício deve obedecer aos seguintes princípios: proximidade dos cidadãos; amplitude e natureza da tarefa e eficácia e economia.
Aplique-se esta Carta Europeia na plenitude e, estou certo, sairemos todos a ganhar.
Por último, e face ao debate que agora se intensificará sobre a redução de Concelhos e Freguesias, deixo uma curta reflexão em voz alta.
Não poderemos colocar a cabeça na areia e dizer que tudo deve ficar na mesma, há que ter espírito aberto para pensar nas novas competências, no pacote financeiro, num novo modelo de eleição dos eleitos locais, sem deixar de tratar da reestruturação física.
Não se deve abordar este tema duma forma isolada, efectue-se uma reforma profunda que traga mais eficácia e proximidade aos cidadãos.
Mas que não se aplique também uma regra de lápis e esquadro, o País é assimétrico, poderá ser indiferente a extinção de uma Freguesia na grande Lisboa ou no Grande Porto, mas já não o será para uma que se encontre num lugar remoto das nossas Beiras.
Que o critério não seja exclusivamente economicista, embora este também pese, e a ser assim o Estado reduzirá muito mais custos se fundir Lisboa com Almada ou Porto com Gaia.
Por último, não se desvalorize o exercício de cidadania que são as Juntas de Freguesia, são aos milhares os nossos concidadãos que dedicam o seu tempo ao serviço da comunidade sem qualquer contrapartida que não seja a satisfação de contribuírem para o bem comum.
Não se desperdice esta disponibilidade, antes se estimulem os cidadãos a participarem mais na vida da sua comunidade.
Esta relação de proximidade é fundamental, outros serviços serão menos úteis, porque não extingui-los?
Todos conhecem a minha opinião, por exemplo, sobre os Governos Civis, para que é que servem senão para efectuarem a propaganda do Governo?
Os mais de 20 milhões de euros que gastam seriam um bom contributo para a diminuição do défice, extingam-se de imediato.
Entre o trabalho que é desenvolvido por qualquer Governador Civil, ou pelo Presidente da Junta de Freguesia mais pequena, opto sem hesitar pelo trabalho do Senhor Presidente de Junta.
Que não se tomem decisões que resultam, muitas vezes, de uma avaliação de quem não conhece o País Real, de facto visto de Lisboa é muito diferente.
Sou favorável ao aprofundamento do Poder Local e a uma reforma profunda, é este o momento certo para o fazer, mas ponderem-se bem as opções.
Concluo citando Tocqueville, “no município é onde reside a força dos povos livres (…) Sem instituições municipais uma nação pode ter um governo livre, mas carecerá de espírito de liberdade”.



Obrigado pela Vossa atenção.

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