Almeida Henriques

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

O estado asfixia

A atmosfera que se vive entre os empresários é de grande angústia e incerteza, agravada pelas múltiplas solicitações que não deixam tempo útil para que se concentrem na gestão efectiva das suas organizações, sobretudo nas de menor dimensão, a esmagadora maioria, com um reduzido número de trabalhadores.
Com a crise do sub prime e a implantação das regras de Basileia II, a palavra de ordem foi sensibilizar as empresas para a necessidade de introduzirem transparência e rigor nas suas contas, para que o rating melhorasse e permitisse o acesso ao crédito em condições mais vantajosas.
Contudo, o despoletar da actual crise, de desfecho imprevisível, com o sistema financeiro a revelar graves problemas de liquidez, veio traduzir-se num verdadeiro apertar do garrote às nossas PME, incluindo as que melhoraram os seus indicadores, esforço que, pelas actuais circunstâncias, não é reconhecido.
Se cobrar era uma tarefa difícil pelas empresas, dentro e fora do País, hoje é quase um milagre, incluindo junto do próprio Estado, que, ao contrário do que seria legitimamente expectável, não dá o exemplo, pagando tarde e más horas.
Paralelamente, assiste-se a uma cada vez maior pressão do fisco, numa verdadeira voracidade que não olha a meios, com constantes inspecções às empresas, com o cutelo permanente da execução fiscal, da penhora dos bens pessoais dos gerentes e administradores e da coima aplicada ao primeiro atraso, ainda que de um dia e em obrigações fiscais declarativas.
Esperava-se que com esta conjuntura o Senhor Primeiro Ministro anunciasse um conjunto de medidas que facilitasse efectivamente a vida das empresas portugueses, que introduzisse efectiva liquidez.
Não serei injusto ao não considerar o anúncio da linha de crédito de 1.000 milhões de euros para as PME. Traduz, de facto, uma boa medida.
O recurso à garantia mútua numa percentagem de 50% e a bonificação dos juros vão no sentido certo, embora não exija um grande esforço orçamental; o sistema de garantia mútua está preparado para estas operações e tem crescido; existem fundos comunitários do QREN já definidos para o efeito, há um resseguro no Fundo Europeu de Garantia Mútua, pelo que o esforço efectivo do Governo é a bonificação de 1%.
Não obstante, poderá permitir transformar créditos de curto prazo em médio prazo, com mais estabilidade e melhores taxas de juro.
A redução do IRC, designadamente com a criação de dois escalões, vai também no sentido positivo, embora sem nenhum impacto directo nas empresas.
Algumas delas, quando chegarem a beneficiar desta redução do IRC, em 2010, já não existirão, terão fechado as portas, sufocadas!
O que faltou no anúncio do Senhor Primeiro Ministro?
Faltou afirmar que o Estado iria colocar em dia os mais de 2.000 milhões de euros que deve às empresas. Esta sim seria uma medida com impacto directo na liquidez das empresas, para além do bom exemplo que era dado à economia, não permitindo os dois pesos e duas medidas que o Estado tem quando cobra ou quando paga.
Faltou colocar o IVA à taxa zero nos fornecimentos ao Estado; é imoral que o Estado não só não pague a tempo e horas como ainda cobre o IVA das facturas que não liquidou; o pagamento do IVA seria feito pela entidade do Estado no momento da liquidação da factura.
Faltou considerar as compensações fiscais. Qual a moralidade de se estar a executar um empresário ou empresa, por dívidas ao fisco, quando o mesmo é credor do Estado?
Faltou a abolição, pura e simples, do injusto Pagamento Especial por Conta.
Sejamos práticos, à vida das micro e PME, à sua sobrevivência, não bastam anúncios elaborados contemplando uma ou outra medida positiva, é preciso um tratamento de choque.
São urgentes medidas que introduzam liquidez e melhorem a tesouraria das empresas portuguesas ou poderemos estar perante um cenário verdadeiramente preocupante a curto prazo.
É preciso que o Estado facilite a vida das micro e PME, não que as sufoque, para que os empresários não percam o seu precioso tempo a fazer tudo, menos gerir a sua organização.
A pressão das cobranças, o Estado mau pagador, a administração fiscal, a burocracia, tudo contribui para dificultar a vida do empresário, contribuindo para a baixa produtividade tão apregoada.

In Jornal de Negócios 9 de Outubro de 2008
António Almeida Henriques
Presidente CEC/ CCIC e Vice Presidente CIP

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